sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Inverno da Alma (2010)

É muito difícil imaginar que ainda existam pessoas que têm que caçar para comer. Pessoas sem acesso à internet ou a produtos tecnológicos modernos, que jamais ouviram falar de iPad, Microsoft ou Facebook pela simples razão que nada disso faria a menor diferença em suas vidas. Inverno da Alma trata da vida de pessoas como essas. Ele entra nesse universo e nem por um segundo foge dele para contar sua história.

Ree Dolly (Jennifer Lawrence) sofre duras penas para cuidar de seus dois irmão menores e da mãe doente em uma cabana rural, longe de qualquer cidade grande (ou mesmo média, ao que tudo indica). Ela conta, relutantemente, com os vizinhos para ajudá-la e procura se manter longe do contato com a família, composta principalmente por seu tio Teardrop (John Hawkes), um personagem inicialmente antipático, mas que acaba se mostrando o principal aliado de Ree, e seu pai, que esteve preso por fabricar drogas.

O filme é montado como uma grande jornada, empreendida por Ree, para salvar a casa onde vive com a família e que acaba se tornando uma jornada de descobrimento e (por que não?) de aceitação do ambiente que a cerca. Ela tem que achar o pai, vivo ou morto, para obrigá-lo a comparecer ou justificar seu não comparecimento a uma audiência penal. A pena para o não comparecimento é a perda da casa como pagamento de suas dívidas.

Um dos principais trunfos da produção é a seleção do elenco. Este é um daqueles filmes que certamente elevarão uma atriz praticamente desconhecida à categoria de estrela. Jennifer Lawrence, indicada ao Oscar e Globo de Ouro, faz o papel de uma jovem mulher forte e objetiva, que parece sempre carregar o fardo mais pesado sem nunca perguntar por que. Sua atuação é contida e, ao mesmo tempo, bastante comovente, um verdadeiro feito para uma atriz tão jovem. No entanto, os personagens que vivem ao seu redor foram escolhidos quase à perfeição, tornando o filme bastante verossímil em toda a sua composição.

Veja, por exemplo, Merab, a esposa de um temido "caubói" da região. Ela é assustadora. Mas não é monstruosa. É fácil perceber as razões pelas quais age de forma violenta e, muitas vezes, maldosa. Ao mesmo tempo, ela possui um lado humano estranhamente embrutecido, que a transforma em uma personagem fascinante, apesar de suas rápidas aparições. Talvez a principal conquista do filme seja que todas as pessoas que habitam seu universo não se mostrem boas ou más, mas apenas produtos de seu próprio ambiente. Elas não julgam e não são julgadas, simplesmente existem daquela forma.

 O filme opta por não mostrar cenas grotescas ou sangrentas, que têm sido uma constante no cinema moderno (nada contra). Ele deixa por conta do espectador imaginar muitas das coisas que estão acontecendo e sua história ganha força com isso. A busca de certa forma psicológica da garota por seu pai acaba se tornando bem sucedida de uma forma diferente. Ela encontra em seu tio, se não um pai, pelo menos um homem preocupado com seu bem estar, que pode sim servir como uma figura paterna. E com uma visão sem preconceitos quanto ao seu vício em cocaína e sua brutalidade.

No final, a "jornada do herói" de Ree acontece apenas para deixá-la na mesma situação material. Ok, com um pouquinho mais de dinheiro. Mas mostra que o reencontro com o seu lado escondido, formado principalmente pelas pessoas que ela conhece ou com quem se refamiliariza (ó, que palavra bonita), pode ser a principal recompensa de toda a história.

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