sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Luzes da Cidade (1931)

O filme mudo de Chaplin, realizado no início da era dos filmes falados, ainda possui força cômica e dramática nos dias de hoje, além de algumas intrigantes cutucadas em problemas sociais. Talvez por isso seus filmes sejam alguns dos que resistiram melhor ao tempo, envelhecendo muito pouco.
No centro, está o amor e fidelidade do eterno vagabundo por uma vendedora de flores cega. Além de pena, ele sente um estranho amor, motivado pelo fato de que ela não pode vê-lo e enxergar sua situação deplorável de mendigo. Apesar disso, ele transforma em sua principal missão devolver a visão da garota, o que causa algumas cenas memoráveis, como a luta de boxe “arranjada” e o seu falso assalto a um milionário bêbado.
Neste filme, Carlitos está mais terno e possui um senso

de justiça muito maior do que em qualquer outro de seus personagens. Ele salva um ricaço de sucessivas tentativas de suicídio, mesmo depois que este o expulsa de sua casa (quando fica sóbrio). Prova ainda maior disso é que não mede esforços para devolver a visão a sua amada, apesar de saber que, quando o vir, ela pode não querer mais nada com ele.
É muito difícil analisar um filme mudo, ainda mais um que é tão cultuado como “Luzes da Cidade”. Porém, vou me arriscar a pequenas análises de seu conteúdo. Em primeiro lugar, algumas de suas cenas são tão magnificamente roteirizadas e coreografadas que não surpreende o fato de terem entrado para a hisória. A principal delas é a sequência da luta de boxe, em que Carlitos procura fugir do seu oponente de todas as formas, ao mesmo tempo em que aplica diversos golpes quando ele não está esperando. É sua cena mais genuinamente pura e funcionaria muito bem até como um curta metragem, se fosse desligada do restante do filme.
O personagem do bêbado milionário também é explorado de maneira interessante, agindo como uma pessoa bastante amistosa quando bêbada e como alguém extremamente mau-humorado quando sóbrio. Aqui vale um parênteses para o que pode ser um comentário sobre os problemas do próprio Chaplin com seus casamentos. O milionário se tornou bêbado porque sua esposa o abandonara. Chaplin passara pelo segundo divórcio poucos anos antes. Mesmo assim, nunca teve problemas com a bebida.
“Luzes da Cidade” é um filme memorável com uma história bonita e bem construída e tiradas cômicas excelentes e, embora não tenha as proporções épicas e históricas de “O Grande Ditador” ou “A Corrida do Ouro”, merece figurar entre os melhores filmes de Chaplin e também de todos os tempos. O final revela muito sobre a sua cinematografia, mostrando a comicidade depressiva e ao mesmo tempo otimista que domina todas as suas produções.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Inverno da Alma (2010)

É muito difícil imaginar que ainda existam pessoas que têm que caçar para comer. Pessoas sem acesso à internet ou a produtos tecnológicos modernos, que jamais ouviram falar de iPad, Microsoft ou Facebook pela simples razão que nada disso faria a menor diferença em suas vidas. Inverno da Alma trata da vida de pessoas como essas. Ele entra nesse universo e nem por um segundo foge dele para contar sua história.

Ree Dolly (Jennifer Lawrence) sofre duras penas para cuidar de seus dois irmão menores e da mãe doente em uma cabana rural, longe de qualquer cidade grande (ou mesmo média, ao que tudo indica). Ela conta, relutantemente, com os vizinhos para ajudá-la e procura se manter longe do contato com a família, composta principalmente por seu tio Teardrop (John Hawkes), um personagem inicialmente antipático, mas que acaba se mostrando o principal aliado de Ree, e seu pai, que esteve preso por fabricar drogas.

O filme é montado como uma grande jornada, empreendida por Ree, para salvar a casa onde vive com a família e que acaba se tornando uma jornada de descobrimento e (por que não?) de aceitação do ambiente que a cerca. Ela tem que achar o pai, vivo ou morto, para obrigá-lo a comparecer ou justificar seu não comparecimento a uma audiência penal. A pena para o não comparecimento é a perda da casa como pagamento de suas dívidas.

Um dos principais trunfos da produção é a seleção do elenco. Este é um daqueles filmes que certamente elevarão uma atriz praticamente desconhecida à categoria de estrela. Jennifer Lawrence, indicada ao Oscar e Globo de Ouro, faz o papel de uma jovem mulher forte e objetiva, que parece sempre carregar o fardo mais pesado sem nunca perguntar por que. Sua atuação é contida e, ao mesmo tempo, bastante comovente, um verdadeiro feito para uma atriz tão jovem. No entanto, os personagens que vivem ao seu redor foram escolhidos quase à perfeição, tornando o filme bastante verossímil em toda a sua composição.

Veja, por exemplo, Merab, a esposa de um temido "caubói" da região. Ela é assustadora. Mas não é monstruosa. É fácil perceber as razões pelas quais age de forma violenta e, muitas vezes, maldosa. Ao mesmo tempo, ela possui um lado humano estranhamente embrutecido, que a transforma em uma personagem fascinante, apesar de suas rápidas aparições. Talvez a principal conquista do filme seja que todas as pessoas que habitam seu universo não se mostrem boas ou más, mas apenas produtos de seu próprio ambiente. Elas não julgam e não são julgadas, simplesmente existem daquela forma.

 O filme opta por não mostrar cenas grotescas ou sangrentas, que têm sido uma constante no cinema moderno (nada contra). Ele deixa por conta do espectador imaginar muitas das coisas que estão acontecendo e sua história ganha força com isso. A busca de certa forma psicológica da garota por seu pai acaba se tornando bem sucedida de uma forma diferente. Ela encontra em seu tio, se não um pai, pelo menos um homem preocupado com seu bem estar, que pode sim servir como uma figura paterna. E com uma visão sem preconceitos quanto ao seu vício em cocaína e sua brutalidade.

No final, a "jornada do herói" de Ree acontece apenas para deixá-la na mesma situação material. Ok, com um pouquinho mais de dinheiro. Mas mostra que o reencontro com o seu lado escondido, formado principalmente pelas pessoas que ela conhece ou com quem se refamiliariza (ó, que palavra bonita), pode ser a principal recompensa de toda a história.

sábado, 1 de janeiro de 2011

Secretariat (2010)

Secretariat é um filme incrivelmente verdadeiro e tocante, que consegue mexer com nossa emoção muitas vezes com aquilo que fica implícito, e não com o que é dito. É o meu filme preferido de 2010 e qualquer um que o assista vai entender porque. Não é um ganhador de Oscar, mas e daí? Muitas pessoas vão amá-lo.

Ele conta a história de Big Red, o cavalo Secretariat, até hoje considerado o melhor cavalo de corrida de todos os tempos e o animal que está melhor posicionado entres os maiores atletas do século passado. O filme começa com a morte da mãe de Penny Chenery (Diane Lane), que agora tem que tomar conta de seu pai com Alzheimer (sua doença nunca é revelada, mas acredito que seja um palpite bastante válido), de sua fazenda e seus cavalos. É em meio a essa história que ela acaba recebendo o cavalo Big Red, que aparentemente nasceu para correr.

O filme procura traçar um paralelo entre a determinação de Penny e a vitória e força de Secretariat. A mensagem é clara e bastante convencional. Não desista dos seus sonhos, siga sempre em frente, não importa o que aconteça, etc. Não seria um filme da Disney sem isso.

Apesar de ser uma produção bastante convencional, em algum ponto, a importância do cavalo cresce de uma forma inteligente e os outros problemas (dinheiro, distância da família, morte do pai, etc.) se perdem no meio do caminho. O elemento excepcional em meio a tudo isso é Secretariat e todos os que entram em contato com ele começam a se dar conta disso. Seu treinador (John Malkovich) não precisa fazer muita coisa, ele parece ter nascido com o espírito livre e vitorioso.

Obviamente que todos sabemos que ele vencerá no final, mas qualquer um que não acompanhe o esporte com muita frequência (eu, por exemplo) vai se surpreender com a última corrida, de longe a melhor cena do filme. Eu bem que tentei, mas foi impossível segurar as lágrimas. Quando o filme acabou, a primeira coisa que fiz foi procurar essa corrida no YouTube. Aqui, fiquei mais surpreso. As imagens são incrivelmente precisas e até a narração da corrida é idêntica. O recorde da pista se mantém e até hoje nenhum cavalo chegou perto de batê-lo.

Este é um filme sobre um ser extraordinário, praticamente inimaginável como um personagem verdadeiro. Eu fiquei chocado e estou até agora. Alguns críticos vão dizer que este é um filme bastante convencional, parecido com muitos outros produzidos pela Disney. Eu discordo. Ele tem uma direção extremamente inteligente e lança um olhar entendido sobre toda a história, que poderia, sim, descambar para uma produção de menor valor e feita para chorar. Sim, eu chorei. Mas as lágrimas vieram com uma espontaneidade tão incrível, que eu tenho certeza que não serei o último a fazê-lo.

Eu não iria tão longe dizendo que este é o melhor filme de 2010 (A Rede Social ainda mantém seu posto), mas, até o momento, é meu favorito (a diferença é grande). Eu amei, o que mais posso dizer?